quarta-feira, 8 de julho de 2020

Brasil: idosa morre sem extrema unção porque hospital impede entrada de padre


Aleteia Brasil


O hospital argumenta que seguiu os procedimentos indicados em decreto devido à pandemia e que o sacerdote não teria informado que a visita era religiosa

Ope. Joseph Thomas, 59 anos, da paróquia Nossa Senhora das Graças, em Praia Grande, SP, foi procurado por volta das 22h30 do último sábado, 4 de julho, pelo paroquiano Manoel de Carvalho Neto, que, nas palavras do sacerdote, “estava desesperado” porque a esposa tinha sofrido um Acidente Vascular Cerebral (AVC) e estava internada em estado grave. De fato, Manoel havia passado os últimos dias completamente dedicado a cuidar da esposa, Evandirce de Carvalho, de 79 anos.

O pe. Joseph conta que entrou em contato antecipadamente com o Hospital Municipal Irmã Dulce para confirmar os horários de visita e a possibilidade de levar a extrema unção à paciente. Ele relata que, por telefone, uma enfermeira lhe informou que a visita poderia ser às 15h do domingo, 5. No entanto, quando Manoel e o sacerdote chegaram ao hospital, o padre foi impedido de entrar na ala em que estava a enferma.

Evandirce faleceu cerca de uma hora depois, sem ter podido receber o sacramento da unção dos enfermos.

A versão do hospital
Em nota, a direção do Hospital Municipal Irmã Dulce contesta algumas afirmações do pe. Joseph, alegando que ele não teria dito que se tratava de uma visita de cunho religioso. Ainda de acordo com a unidade, a equipe explicou detalhadamente ao padre o plano de contingência devido à pandemia, baseado no Decreto Municipal 6922, de 19 de março de 2020. Em seu artigo quinto, o decreto suspende por prazo indeterminado “as visitas aos pacientes internados no Hospital Irmã Dulce e Unidades de Pronto Atendimento”.

O hospital complementa a nota afirmando que, se a equipe tivesse sido informada do caráter religioso da visita, a entrada do sacerdote teria sido liberada, desde que adotadas todas as medidas de segurança previstas.

A versão do sacerdote e do esposo da paciente
O pe. Joseph, no entanto, afirma:


“Eu tenho crachá para entrar no hospital, mas, mesmo apresentando-o lá na hora, não deixaram”.

Trata-se de um crachá que o identifica explicitamente como sacerdote e que foi obtido por ele e por outros padres, há cerca de 5 anos, justamente para simplificar as visitas a pacientes e evitar “várias confusões” que haviam ocorrido no passado, conforme depoimento do próprio pe. Joseph.

A este respeito, o sacerdote comenta que a negativa de acesso deste domingo não foi o primeiro caso:


“Já teve casos de padres serem humilhados. Depois de várias confusões, conseguimos crachá para entrar sem nenhuma barreira há cerca de cinco anos. Mas tem hospital que não respeita e não autoriza. Essa família da idosa quer até fazer queixa do que aconteceu no local. Eu fui até no horário de visita, para não ter problema. Então fiquei bem chateado, porque nunca saio na rua; foi nesse caso especial que saí, com uso de máscara e álcool, para ajudar a família. Estou revoltado”.

Sobre a visita impedida no domingo, o sacerdote descreveu assim o episódio:

“[O esposo da paciente] disse para o pessoal do hospital: ‘Minha mulher está morrendo, está nos últimos momentos e eu gostaria que o padre pudesse dar a extrema-unção a ela. Por favor, deixe’. Mas eles falaram que eu estava proibido de entrar devido ao coronavírus”.

O pe. Joseph acrescenta que destacou o direito da paciente e que apenas lhe daria a unção:

“A equipe do hospital ligou para o chefe da segurança, que também proibiu. Voltei para casa e fiquei muito triste com a situação. Até deixei recado para eles e disse que, se algo acontecesse, seria culpa deles. Porque eu só estava fazendo minha parte, que é garantida por lei”.

A lei 9.982, de julho de 2000, garante “aos religiosos de todas as confissões o acesso aos hospitais da rede pública ou privada, bem como aos estabelecimentos prisionais civis ou militares, para dar atendimento religioso aos internados (…) Os religiosos chamados para prestar assistência nas entidades devem acatar as determinações legais e normas internas de cada instituição hospitalar ou penal, a fim de não pôr em risco as condições do paciente ou a segurança do ambiente hospitalar ou prisional“.

Manoel de Carvalho Neto, o marido da paciente falecida, também se manifestou:

“É ridículo acontecer isso. O padre foi com todo carinho dar a unção para a minha mulher, que estava em estado grave. Ele conhecia ela há muitos anos e nós fazíamos parte até do coral da igreja. Uma hora depois que ele foi impedido de entrar, ela morreu”.