Todo homem tem desejo natural de saber; mas que
aproveitará a ciência, sem o temor de Deus? Melhor é, por certo, o humilde
camponês que serve a Deus, do que o filósofo soberbo que observa o curso dos
astros, mas se descuida de si mesmo. Aquele que se conhece bem se despreza e
não se compraz em humanos louvores. Se eu soubesse quanto há no mundo, porém me
faltasse a caridade, de que me serviria isso perante Deus, que me há de julgar
segundo minhas obras?
Renuncia ao desordenado desejo de saber, porque
nele há muita distração e ilusão. Os letrados gostam de ser vistos e tidos por
sábios. Muitas coisas há cujo conhecimento pouco ou nada aproveita à alma. E
mui insensato é quem de outras coisas se ocupa e não das que tocam à sua
salvação. As muitas palavras não satisfazem à alma, mas uma palavra boa
refrigera o espírito e uma consciência pura inspira grande confiança em Deus.
Quanto mais e melhor souberes, tanto mais
rigorosamente serás julgado, se com isso não viveres mais santamente. Não te
desvaneças, pois, com qualquer arte ou conhecimento que recebeste. Se te parece
que sabes e entendes bem muitas coisas, lembra-te que é muito mais o que
ignoras. Não te presumas de alta sabedoria (Rom 11,20); antes, confessa a tua
ignorância. Como tu queres a alguém te preferir, quando se acham muitos mais
doutos do que tu e mais versados na lei? Se queres saber e aprender coisa útil,
deseja ser desconhecido e tido por nada.
Não há melhor e mais útil estudo que se conhecer perfeitamente
e desprezar-se a si mesmo. Ter-se por nada e pensar sempre bem e favoravelmente
dos outros, prova é de grande sabedoria e perfeição. Ainda quando vejas alguém
pecar publicamente ou cometer faltas graves, nem por isso te deves julgar
melhor, pois não sabes quanto tempo poderás perseverar no bem. Nós todos somos
fracos, mas a ninguém deves considerar mais fraco que a ti mesmo.
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