Neste
mistério salvífico da fuga para o Egito, “José, depositário e cooperador do
mistério providencial de Deus, também no exílio vela por Aquele que vai tornar
realidade a Nova Aliança’ (RC 14). Ali ele foi instrumento do qual Deus se serviu
para “chamar do Egito o seu Filho”
Terminada
todas as vicissitudes e contratempos, de regresso do exílio, José estabeleceu-se com a sua família na
pequena Nazaré e retomou as suas atividades de artesão. Afinal, era esta a sua
profissão.
De
volta ao seu ambiente, tudo se tornara mais fácil. Portanto, dificilmente teria
encontrado dificuldade em retomar os seus trabalhos na aldeia e nas
vizinhanças, pois embora não fosse um homem de cátedra, era muito prático e
capaz de, nas ocorrências da vida, tomar decisões não só no que se referia a si
mesmo, como também aos outros.
A
sua profissão fazia dele um homem bastante conhecido entre os nazarenos, e o
período que passou longe da sua terra, sem
manter contato com os parentes e conterrâneos, não foi suficiente para
apagar da memória do povo a imagem daquele homem completo, com sua
personalidade rica e responsável em seus deveres.
Sua
pequena oficina, que permaneceu por um bom tempo fechada, empoeirada e
desapercebida, começava novamente a ser o ponto de encontro das pessoas, o
ponto de referência para muitos da cidade e da região circunvizinha. Muito mais
que isso, era o palco sublime da presença de Jesus criança e iniciante na arte
da carpintaria. De novo o barulho da serra e do
martelo passava a chamar a atenção dos transeuntes e a dar tom de vida
mais movimentada à pacata cidadezinha.
Como
antes, as mãos habilidosas do carpinteiro de Nazaré eram requisitadas não só
para fabricar uma mesa ou um par de cadeiras, mas também para abrir uma valeta no quintal de um
vizinho, consertar uma porta ou uma
janela numa das poucas centenas de casas pobres do lugarejo, ou ainda traçar com maestria e
habilidade os fundamentos de uma nova construção.
Desta maneira, o dia-a-dia de José começava a
tomar novamente o seu ritmo, junto com a sua castíssima esposa e o seu filho,
que “crescia robusto, cheio de sabedoria, pois a graça de Deus estava com ele”
(Lc 2,40).
Como
qualquer criança de seu tempo, Jesus queria crescer, e por isso observava com
atenção o comportamento do pai e da mãe e se espelhava nos seus exemplos para
tornar-se como eles. Será um aluno atento na
carpintaria como esmero e manejo da serra e as pancadas certeiras
do martelo. Sentir-se-á feliz aos
sábados, ao deixar a labuta da oficina
ou os bancos da escola para acompanhar o
pai à sinagoga, ficará admirado ao seguir com atenção seus gestos e suas
inclinações na casa de oração, sentira
orgulho dele ao vê-lo encaminhar-se para frente na sinagoga, pegar o pergaminho
da palavra de Deus nas mãos e proclamar em voz alta e altissonante a todos os presentes a palavra do Senhor.
Será
no convívio com os pais que aprenderá o
que é necessário para a vida, mas será também na sinagoga, lugar rico em
ensinamentos, que irá entender muitas coisas. Atraído por sua curiosidade de
criança, saberá que a pequena lâmpada, sempre acesa diante do armário que
guarda sigilosamente os pergaminhos da Sagrada Escritura, simboliza a luz da
lei divina ali presente que ilumina todos os homens.
Será
na freqüência à sinagoga que compreenderá que as estrelas de seis pontas
significam o emblema do seu antepassado Davi, o grande rei que escreveu salmos
belíssimos, muitos dos quais já sabia de cor, pois tinha aprendido em casa nos
joelhos de Maria, sua mãe, ou na
companhia do pai na carpintaria.
Será
na sua família, pequena escola de
Nazaré, que Jesus aprenderá a rezar e santificar o dia elevando o pensamento a Deus com as orações costumeiras
do israelita. José e Maria, cientes da educação devida ao filho, não se
limitarão a transmitir ensinamentos a Jesus apenas em casa, mas seguramente o
encaminharão todos os dias a uma escola sinagogal, onde terá como livro os textos sagrados e como professor um rabi. Na escola aprenderá a recitar em voz
alta o Shemá, a fórmula fundamental da fé do seu povo, assim como aprenderá
longos trechos do Pentateuco.
Em casa, aos poucos, entenderá os episódios, da
história do seu povo, e como toda criança começará a amar os seus heróis
estudados nos textos sagrados, como os Profetas, o poderoso José do Egito,
Moisés o grande libertador e líder que conduziu o povo da escravidão do Egito pelo deserto por
quarenta anos até a terra prometida, e
Davi, que na sua simplicidade abateu o gigante Golias...
Com
José Jesus irá aos poucos aprendendo o significado das grandes festas
religiosas do seu povo que eram celebradas durante o ano (Era costume entre os
hebreus visitar Jerusalém três vezes ao ano: nas festas da Páscoa, de
Pentecostes e dos Tabernáculos. Os que moravam longe de Jerusalém tinham a
obrigação de uma só viagem, justamente para os festejos da Páscoa).
Quando
já havia completado 12 anos, teve a oportunidade de participar pela primeira
vez dos festejos da Páscoa na cidade santa de Jerusalém. Levar o filho pela
primeira vez para participar oficialmente do culto ao verdadeiro Deus era
motivo de muita alegria para todos os pais.
As
cerimônias desses dias tinham um significado muito profundo. José, a exemplo de
outras famílias de sua cidadezinha, preparou tudo para fazer a peregrinação a
Jerusalém, comida para a viagem, tenda para pernoitar, afinal eram quatro dias
de viagem pelos montes de Judá, percorrendo em média 35 quilômetros por dia,
além do burrinho para transportar tudo.
Chegados
a Jerusalém, estes simples aldeões de Nazaré puderam admirar o palácio de
Herodes com suas torres e muros, o formalismo dos fariseus e sobretudo espantar-se com o
extraordinário número de peregrinos, fazendo com que a população, que
normalmente era 78 mil, passasse para 150 mil ou mais pessoas. Tudo ali se confundia:
costumes, língua e gente diferente misturada com pobres, doentes, coxos e cegos
que aproveitavam os festejos para mendigar. No dia do início dos festejos José
estava lá acompanhando Jesus, na parte do
pátio do Templo reservada aos homens.
Terminados
os festejos, que se prolongavam mais dias, era tempo de voltar para casa. Os
peregrinos de Nazaré se reúnem para em caravana empreender a viagem de retorno,
subdivididos em grupos de homens e mulheres. Jesus, porém, ficou na cidade,
entre os pórticos do Templo, sem que seus pais percebessem, e ouvia os
ensinamentos dos rabinos.
Sua
ausência na caravana foi notada quase depois de um dia de viagem, quando devem
ter parado para descansar junto à fonte de Berot. Imediatamente os seus pais
voltam a Jerusalém e o procuram por todos os lados, até que o encontram entre
os doutores. Sua mãe, apreensiva, perguntou-lhe: “Filho, por que você procedeu
assim com a gente? Seu pai e eu estávamos bastante aflitos procurando
você". (Lc 2,48).
Nestas
palavras de Maria fica evidenciada a paternidade real de José; não só os que
ignoravam a divindade e a concepção admirável de Cristo chamam José de pai de
Jesus, afirma Suárez, mas o próprio evangelista e também a Virgem Maria (Mistérios de la vida
de Cristo, Madrid, 1958, Vol I, pp.
263-264).
Comumente
a iconografia apresentou este fato ocorrido aos doze anos da vida de Jesus como
“A perda de Jesus de Jerusalém”, porém seguramente não foi uma perda de Jesus
entre a multidão que se apinhava em Jerusalém naqueles dias, mas sim uma
decisão livre e espontânea do próprio Jesus.
Ele
mesmo quis permanecer lá, e não foi por
um descuido de seus pais. Devemos notar que, aos doze anos, os adolescentes
israelitas começavam a gozar uma certa autonomia e já eram considerados
socialmente.
Assim,
não foi difícil para Jesus conseguir o seu intento, mesmo porque os adolescentes
podiam acompanhar tanto o pai como a mãe em caravanas separadas, as quais se
encontravam somente em alguns pontos preestabelecidos. Portanto, nem José nem
Maria podiam imaginar que Jesus tivesse ficado em Jerusalém.
Depois
de encontrá-lo, Jesus desceu com eles para Nazaré e, no seio da Sagrada
Família, uma das tantas famílias desta pequena cidade da Galiléia, crescia e
“robustecia-se de sabedoria, e a graça
de Deus estava com ele” (Lc 2,40).
Estas poucas palavras resumem o longo
período da vida “oculta” que Jesus viveu à espera do cumprimento da sua missão
messiânica. Durante todo esse período, Jesus viveu no âmbito da sua família,
sob os cuidados de São José, que tinha conforme os deveres de um pai na época,
a responsabilidade de alimentá-lo, vesti-lo e instruí-lo na lei e ensinar- lhe
um ofício. Nesse contexto, Jesus crescia “em sabedoria, em estatura e em graça”
(Lc 2,52), tudo na docilidade total aos seus pais “era-lhes submisso” (Lc 2,51).
Correspondia,
portanto, com todo respeito às atenções de seus pais e, “dessa forma, quis
santificar os deveres da família e do
trabalho, que ele próprio
executava ao lado de José” (João Paulo II, Exortação Apostólica
Redemptoris Custos, Roma, 1989 - RC 16).
Os
evangelistas silenciam completamente sobre os anos da “vida oculta” de Jesus em Nazaré. Sabemos apenas
que levou uma vida comum, não apresentando nada de especial entre os habitantes
da sua cidade. Na oficina de José, acompanhou os acontecimentos por vezes tumultuados
da história do seu povo, cujo governador, Arquelau, destacava-se pela
crueldade, mostrando ter um braço forte
para governar. Seu comportamento tirano gerava rebeldia, movimentos de revolta
comandados por líderes espontâneos que se estendiam por toda a Judéia. Aspirava
como qualquer cidadão do seu tempo a uma verdadeira e completa libertação, que
depois iria pregar com toda veemência pelas terras da Palestina.
A
instabilidade política reinante no país e o descontentamento do povo com o
domínio dos romanos marcaram profundamente as etapas da vida de Jesus adolescente e jovem. Contudo,
todos esses anos foram acompanhados pelos constantes e sábios conselhos de José
educador. Ali, na casa de Nazaré, José transmitia ao filho a sua experiência
profissional e humana.
Questões
para o aprofundamento pessoal
1. Leia e tome conhecimento do relato de Mt
2,19-23. Para onde a Sagrada Família dirigiu-se depois do exílio? O que José
passou a fazer após este acontecimento? Como podemos individuar a sua profissão
2. Qual o episódio marcante de Jesus na vida
de José e Maria durante a vivência em Nazaré e em que passagem de Lucas Maria
evidencia a paternidade de José sobre Jesus?
Por
Centro de Espiritualidade Josefino Marelliana
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