Silvia Lucchetti
Duzentas jovens
britânicas entre 9 e 15 anos foram submetidas a cirurgia para modificar a
vagina
Lembro-me que, quando
pequena, eu sonhava em ter uma grande cozinha como a da minha mãe. Quando ela
comprou para mim uma minicozinha de brinquedo, comecei a chorar porque era
falsa, de plástico e pequena. Tive uma cozinha da Barbie com as janelas cor-de-rosa,
o forno e a pia desenhada em uma etiqueta. Mas como uma garota lunática com um
amor pelas coisas grandes, eu queria a versão em tamanho real! Então meu avô
comprou panelas para mim – mas não panelas de plástico. Panelas reais! Com
tampas! Eu estava em êxtase; pensei que alguém finalmente tivesse entendido.
Quem sabe quantas
pessoas podem contar histórias como a minha…
Essa garota quer um
castelo, aquela quer um aspirador de pó, a outra quer um cavalo e outra quer
uma cauda de sereia.
Mas nunca entendi por
que uma criança gostaria de ter uma vagina diferente.
Quando eu li um artigo
recente em Vanity Fair intitulado “Eu quero uma vagina como a da Barbie”,
fiquei chocada.
Este era o subtítulo:
“Na Inglaterra, 200 garotas, menores de idade e, em alguns casos, não mais que
9 anos, passaram por cirurgia para mudar sua própria vagina”.
Sim, você leu
corretamente. 200 meninas.
Entre 2015 e 2016,
segundo Vanity Fair, pelo menos 200 jovens, muitas delas ainda na escola
primária e mais da metade com menos de 15 anos, solicitaram a cirurgia na
vagina no sistema de saúde inglês. Na Inglaterra, o Sistema Nacional de Saúde
faz tais cirurgias apenas por razões médicas, não por razões estéticas.
“As meninas sabem que
vão conseguir a operação se disserem que sua condição tem consequências sobre
seu relacionamento com esportes e sexo. Elas sabem que essa é uma forma de
pressionar”, afirma o artigo.
O programa Victoria
Derbyshire, que é um programa de notícias da BBC na Inglaterra, forneceu os
dados e convidou a Dra. Naomi Crouch, diretora da Society for Pediatrics and
Gynecology (Sociedade de Pediatria e Ginecologia) para adolescentes ingleses,
para discutir isso. Ela expressou profunda preocupação com a situação.
“As meninas às vezes
saem com comentários como, ‘eu apenas odeio isso, eu só quero isso removido’, e
para uma garota se sentir dessa maneira sobre qualquer parte de seu corpo –
especialmente uma parte que é íntima – é muito perturbador”, disse a Dra.
Crouch.
Alguns especialistas
apontam que esta “dismorfia” – insatisfação com a imagem corporal – é causada
pela exposição excessiva de crianças e adolescentes a material pornográfico,
que agora é muito fácil de acessar (tudo o que eles precisam é de um telefone
celular com conexão à internet), gratuito, e pode ser visto anonimamente.
Talvez não percebamos
como a pornografia é realmente mortal, penetrante e violenta. Especialmente
quando é “imposta” às crianças. Deve haver maior controle, e esses sites devem
ser fechados. Os pais devem sempre estar vigilantes e bloquear o acesso ao
conteúdo pornográfico em seus tablets, computadores e TVs. Os pais também devem
instigar os professores da escola para que fiquem mais atentos ao que as
crianças estão observando.
Muitas vezes, a
primeira experiência de uma criança com a pornografia é quando ela é mostrada
por um amigo ou um colega de escola. E é traumático. Como a sexologista belga
Thérèse Hargot explica no livro A Sexually Liberated Youth… Almost, o primeiro
encontro infantil com a pornografia é uma experiência “imposta a eles por
outro, voluntaria ou involuntariamente. Nesses casos, as imagens são impostas a
um espírito que não formulou o desejo. É uma espécie de estupro, uma violação
da imaginação”.
A Dra. Zulueta, uma
ginecologista com mais de 30 anos de experiência, também comentou a tendência:
“Eu estou vendo meninas de 11, 12, 13 pensando que há algo de errado com sua
vulva – que tem a forma errada, o tamanho errado, e realmente expressando desgosto.
A sua percepção é que os lábios internos devem ser invisíveis, quase como uma
Barbie”.
Uma vagina invisível
como a da Barbie. O mundo ficou louco.
Essas imagens
distorcidas causam tal solidão e confusão em nossas meninas e podem levá-las a
rejeitar sua própria feminilidade.
E não é absurdo seus
pais aceitarem as vontades de suas filhas ao invés de ajudá-las a lidar com os
reais problemas subjacentes? Não é inconcebível que eles deem permissão a suas
filhas para serem submetidas a uma cirurgia com todos os riscos envolvidos? É
como se estivéssemos falando sobre a obtenção de uma nova máscara para o
carnaval ou um esmalte de unha brilhante.
E tudo isso acontece na
Inglaterra moderna!
Algo está muito errado
quando os pais de Charlie Gard não conseguiram levá-lo aos Estados Unidos para
tratamento, mas os pais de meninas de 9 anos podem levar suas filhas ao
hospital para uma cirurgia íntima.
Vale a pena perguntar:
que tipo de sociedade cria a pornografia? Que tipo de impacto essas imagens têm
nas crianças e em nossos próprios filhos?
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