Deus nos criou com o
maravilhoso e desafiador presente da liberdade, envolvendo-nos com imenso amor
e aguardando a resposta a todas as oportunidades oferecidas, cujo nome tantas
vezes é missão. Dentre tantas figuras emblemáticas, a história de Jonas é
carregada de ensinamentos (Cf. Jn 3,1-5.10). Os problemas a serem enfrentados
parecem imensos para as poucas possibilidades daquele homem. Basta pensar numa
grande cidade como as nossas, ainda que limitada diante das metrópoles de nosso
tempo. Pregar a um povo praticamente pervertido, corrupto, estragado pela
maldade. E Jonas foge, quer escapar da missão. As circunstâncias de uma viagem
lhe provocam uma séria revisão de vida. Um novo chamado de Deus, que não
desiste quando quer envolver uma pessoa, faz com que o profeta limitado e
tímido tome a palavra diante da cidade. A um povo necessitado de conversão,
Jonas prega a destruição! Mas Deus passa na frente e suscita uma reação
diferente. Do maior ao menor, todos querem mudar de vida, o que suscita
indignação do profeta pessimista, pois vê que Deus tem um coração mole!
Quando Jesus chama seus
primeiros discípulos (Cf. Mc 1,14-20), vai ao encontro de homens simples, cada
um com sua profissão e sua família, carregados de seus limites pessoais, a
ponto de se sentirem por vezes indignos de assumir a missão. Alguns são
pescadores, outros até publicanos, havia gente de grupos radicais, como os
zelotas. Com certeza foram muitos aqueles dos quais os Evangelhos não
reportaram detalhes e, chamados, fugiram da raia, como aconteceu no episódio do
jovem rico. No entanto, muitos responderam, deixaram-se transformar pelo
chamado à conversão, assumiram corajosamente o anúncio do Evangelho e se
transformaram em verdadeiros ícones para as gerações que os sucederam,
estendendo até hoje a imensa rede de seguidores e discípulos de Jesus Cristo.
Sabemos que as
propostas do Evangelho são provocantes, convidando-nos a nadar contra a
correnteza. Basta escutar o Apóstolo São Paulo, no texto proclamado em nossas
celebrações eucarísticas do final de semana (Cf 1 Cor 7, 29-31), para identificar
a verdadeira revolução de que o cristianismo é portador: “Eu digo, irmãos: o
tempo abreviou-se. Então, que, doravante, os que têm mulher vivam como se não
tivessem mulher; os que choram, como se não chorassem, e os que estão alegres,
como se não estivessem alegres; os que fazem compras, como se não estivessem
adquirindo coisa alguma, e os que tiram proveito do mundo, como se não
aproveitassem. Pois a figura deste mundo passa”.
Como seguir Jesus
Cristo, quando sua proposta é absolutamente diferente das ofertas diárias,
propagandeadas pelos meios de comunicação e expostas cotidianamente pelas
pessoas? Incrível é que Ele continua e continuará atraindo e chamando, até o
fim dos tempos! Provocador é o fato de que a juventude é chamada a confrontar
com Ele a sua vida, e muitos são os jovens, de qualquer situação social, que se
dispõem inclusive a deixar tudo para segui-lo de perto, assumir a vida
sacerdotal, missionária, religiosa e comunitária! E não são poucos os casais e
até famílias inteiras transformadas em “famílias missionárias”, dispostas em ir
até outras partes do mundo para evangelizar, como nós as temos no ambiente da
Arquidiocese de Belém. É que Deus é o Senhor da história, e a última palavra
será dada por ele, na vinda gloriosa do Salvador, no fim dos tempos!
Até lá, continuaremos a
assistir o chamado de Deus acontecendo de formas inesperadas ou inusitadas. E
desejamos provocar positivamente nossa juventude, desejando-lhe um caminho de
discernimento. Às gerações de adultos, especialmente pais e mães de família,
assim como sacerdotes, religiosos e religiosas, cabe a tarefa de contribuir
para que a atual geração de jovens não deixe passar em vão a visita de Deus em
suas vidas. O ano que vivemos, com a preparação do Sínodo dos Bispos sobre a
juventude e o discernimento vocacional, oferece-nos uma oportunidade excelente
para que o assunto “vocação” encontre espaço em nossas comunidades e famílias.
Nossa fonte é o texto preparatório do Sínodo, disponível para a leitura e
aprofundamento de todos na página eletrônica do Vaticano.
Desejamos contribuir
para que os jovens reconheçam os apelos existentes na realidade: O
reconhecimento diz respeito antes de tudo aos efeitos que os acontecimentos da
minha vida, as pessoas com as quais me encontro, as palavras que ouço ou que
leio produzem na minha interioridade: uma variedade de “desejos, sentimentos,
emoções” de natureza muito diferente: tristeza, obscuridade, plenitude, medo,
alegria, paz, sensação de vazio, ternura, raiva, esperança, tibieza, etc.
Reconhecer requer que se traga à tona esta riqueza emocional e que se mencionem
estas paixões, mas sem as julgar. Exige também que se sinta o “gosto” que elas
deixam, ou seja, a consonância ou dissonância entre o que se experimenta e
aquilo que existe de mais profundo.
Depois, não é
suficiente reconhecer aquilo que nós experimentamos: é necessário
“interpretá-lo” ou, em outras palavras, compreender para o que o Espírito nos
chama através daquilo que suscita em cada um. Uma vez reconhecido e
interpretado o mundo dos desejos e das paixões, o ato de decidir torna-se
exercício de autêntica liberdade humana e de responsabilidades pessoais,
obviamente sempre situadas e, portanto, limitadas. A decisão deve ser posta à
prova dos acontecimentos, tendo em vista a sua confirmação. A escolha é chamada
a traduzir-se em ação, a encarnar, a dar início a um percurso, aceitando o
risco de se confrontar com aquela realidade que tinha posto em movimento
desejos e emoções. Reconhecer os apelos de Deus, interpretá-los e decidir!
Maravilhosa aventura a ser proposta aos nossos jovens, para que assumam os
desafios da vida cristã e aceitem, como os primeiros discípulos de Jesus, ser
pescadores de homens!
Por Dom Alberto Taveira
Corrêa – Arcebispo de Belém do Pará
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